Tradução: Dra. Giovana Del Prette
Nós estamos consumindo porções cada vez maiores em pratos cada vez maiores. A indústria alimentícia continua nos empurrando a comer mais. Podemos aprender a controlar nossas doses?
Se você quer ver o quão inflados os tamanhos das nossas porções de comida se tornaram, não vá ao supermercado – vá a uma loja de antiguidades. Você nota uma pequena taça claramente concebida para uma boneca , apenas para ser dito que é uma “taça de vinho” . O que se parecem com pratos rasos vêm a ser pratos pratos de jantar. Os pratos rasos verdadeiros se assemelham a pires.
De volta à cozinha moderna, você de repente nota o quão grande tudo é – 28cm se tornou um diâmetro normal para um prato, que nos anos 50 teriam 25cm. Apenas porque estamos comendo fora dos grandes territórios da China, não significa é claro que temos que nos servir de porções maiores. Mas isso acontece, isso geralmente acontece. Brian Wanskink é um psicólogo (autor de Mindless Eating: Why we eat more than we think) que fez inúmeros experimentos para provar aquilo que provavelmente nosso senso comum já nos diz: que utensílios grandes nos fazem consumir porções maiores. Uma concha maior de sorvete irá fazer você ingerir mais sorvete, um copo maior fará você colocar mais suco. Por não parecer muito mais, nós ainda nos sentimos consumindo razoavelmente a mesma quantidade. Lansink chama isso de ilusão de contraste do tamanho. O “perigo real dessas armadilhas da cozinha”, escreve Lansink, é que “quase todas as pessoas no mundo acreditam que estão imunes a elas”.
Com o que uma porção recomendada realmente se parece
De fato, parece que as únicas pessoas que estão imunes a porções grandes são as crianças pequenas. Até a idade de três ou quatro anos, as crianças têm a invejável habilidade de parar de comer quando elas estão cheias. Depois dessa idade, essa auto-regulação da fome se perde, e às vezes nunca mais é reaprendida. Esse é um fenômeno que atravessa as culturas, de Londres a Pequim. Um estudo americano apontou que quando crianças de três anos de idade eram servidas de porções pequenas, médias ou grandes de macarrão com queijo, elas sempre comiam basicamente a mesma quantidade. Em contraste, crianças de cinco anos de idade comiam muito mais se a porção de macarrão com queijo era maior.
Num mundo em que a comida está sempre presente, muitos de nós temos nos tornado como em Alice no País das Maravilhas, controlados por bolos que dizem “Coma-me” e por garrafas que dizem “Beba-me”. Como o nutricionista Marion Nestle salientou há 10 anos atrás em seu livro, O que Comer: “É da natureza humana comer quando a comida está presente, e comer mais quando mais comida está presente”. O problema é que mais comida é empurrada para nós, mais frequente e diariamente. Em 2013, o British Heart Foundation publicou um relatório chamado “Distorção das porções”, sobre o quanto o tamanho das porções na Inglaterra mudou desde 1993. Naquela época, o peso médio de um muffin era 85g, ao passo que 20 anos depois não é incomum encontrar muffins pesando 130g. Refeições prontas também inflaram de tamanho, com tortas de frango expandindo 49% e tortas de cordeiro praticamente dobrando de tamanho desde 1993 (de 210g para 400g). Comer demais num ambiente como esse pode ser menos por falta de força de vontade do que por estar imerso nesse contexto. Psicólogos da alimentação falam sobre o “viés da unidade”, significando que nós estamos inclinados a pensar que uma porção iguala uma unidade de algo, não importa qual o tamanho. Mesmo quando é um único pedaço de pizza de 2.000 calorias que os nutricionistas encontraram em Nova York: calorias para um dia inteiro em um único lanche.
Mas enquanto as porções em cafés e restaurantes são frequentemente gigantescas, as porções recomendadas nos pacotes de comidas podem ser irrealisticamente pequenas. Para a maioria dos cereais de café da manhã, a “porção recomendada” nos Estados Unidos é 30g. Dentre os produtos Kellogg’s, os cereais de milho são apenas 17g. Para meu filho de 16 anos de idade, isso é dificilmente mais do que uma bocada (admito, ele tem 1m86cm). Há alguns anos atrás, eu entrevistei um porta-voz da Kellogg’s, que disse que essas pequenas porções recomendadas foram feitas para crianças, mas admitiu que adultos “comem um pouco mais”. Certamente que sim. Um estudo em 2013 encontrou que quando 140 adultos britânicos em Southend e em Birmigham foram solicitados a se servirem de cereais de milho na quantidade que normalmente consomem, 88% dos participantes pegaram mais do que 30g. A média foi de 44g.
Nossa confusão sobre as porções na Inglaterra está associada ao fato de que nós perdemos muitos dos nossos instintos básicos sobre cozinhar. Quando o departamento de saúde nos diz que a porção ideal de brócolis é “dois pedaços”.