Por: Dra. Giovana Del Prette
Nos últimos dias, uma campanha online contra o preconceito de gênero ganhou grande repercussão nas redes sociais. Com o uso da hashtag #meuamigosecreto, as pessoas foram instigadas a denunciar comportamentos opressores e machistas de colegas e conhecidos em suas redes sociais.
Muitos relatos expuseram a forma como algumas pessoas tem o hábito de manipular emocionalmente suas companheiras(os) com o objetivo de controlá-las(os). Esse comportamento abusivo é conhecido pelo termo de Gaslighting, que teve origem no filme norte-americano Gaslight, de 1944, estrelado por Ingrid Bergman.
No longa-metragem, a atriz interpreta uma mulher muito rica casada com um homem que deseja roubar a sua fortuna. Para isso, ele esquematiza um plano para que ela seja internada em um manicômio. O personagem chega a desligar e acender as lâmpadas a gás da casa convencendo a mulher de que isso está acontecendo somente em sua imaginação. Aos poucos, ela acredita que realmente está ficando louca.
Essa forma de manipular o senso de realidade da outra pessoa é a característica principal do efeito Gaslighting. Para entender melhor como isso funciona na realidade, veja um exemplo: uma jovem extrovertida, que costuma sorrir facilmente e falar com todo mundo aonde vai tem um namorado amoroso e protetor, com quem ela sonha se casar. Porém, esse namorado também é ansioso e desconfiado com as pessoas. Toda vez que os dois passeiam juntos, ele implica com o jeito amigável da jovem e sugere que ela está muito “saidinha” e que as pessoas com quem ela conversa não são tão legais quanto parecem, principalmente se são outros homens. E ainda insinua que estão tentando seduzi-la.
No começo, ela não dá muita atenção às críticas, pois sempre teve esse jeito. Mas, com o passar do tempo, as discussões vão aumentando, até que ela começa a acreditar que realmente tem um comportamento inadequado em público e está desapontando uma das pessoas que ela mais ama. Você provavelmente já deve ter passado por esse tipo de situação alguma vez ou ouvido uma história parecida de alguma amiga(o), certo? Pois bem, esse tipo de abuso emocional pode ocorrer não só entre casais, como também entre pais e filhos e até em relações no trabalho. Entretanto, o Gaslighting costuma ser mais frequente em relacionamentos amorosos.
De acordo com o livro The Gaslight Effect, de Robin Stein, psicóloga e diretora do Centro de Inteligência Emocional da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, o efeito Gaslighting é insidioso. Quando alguém em quem confiamos, respeitamos e amamos fala com grande certeza sobre um fato do qual fazemos parte, é muito difícil não acreditarmos nele, ainda mais se idealizamos essa pessoa em nossas vidas. Dessa forma, acabamos perdendo o nosso senso de realidade. Além disso, como sentimos a necessidade de ter a aprovação dessa pessoa, acabamos prolongando o efeito Gaslighting.
Stein explica também que o “gaslighter” (indivíduo que abusa emocionalmente) e a vítima podem não estar conscientes do que está acontecendo. O “gaslighter” pode acreditar em cada palavra que diz ou achar sinceramente que ele está apenas salvando sua companheira dela mesma. Mas, a psicóloga ressalta que esse indivíduo é movido por suas próprias necessidades, e embora pareça ser forte e poderoso, no fundo ele se sente fraco e impotente. Dessa forma, para se sentir seguro e que está no controle da situação, ele tenta provar que está certo e faz com que a parceira concorde com ele. Como resultado: a vítima questiona seu próprio senso de realidade e passa a se sentir ansiosa, confusa e deprimida. Ou seja, a relação do casal se torna desmoralizante e destrutiva.
Veja abaixo alguns sinais que indicam se você está sendo vítima de Gaslighting, de acordo com o livro de Stern, “The Gaslight Effect: How to Spot and Survive the Hidden Manipulations other people use to control your life”:
Você duvida de si mesma(o) constantemente.
Você se pergunta “eu sou sensível demais?” várias vezes ao dia.
Você constantemente se sente confusa(o) ou até mesmo maluca(o).
Você está sempre pedindo desculpas ao seu parceiro(a), mãe, pai ou chefe.
Você não entende por que, com tantas coisas aparentemente boas na sua vida, você não está mais feliz.
Você se pergunta frequentemente se está sendo boa/bom suficiente ao seu parceiro(a), chefe, amigo ou filho.
Você frequentemente cria desculpas para justificar o comportamento do seu parceiro(a) para seus amigos e sua família (ou até para si mesma/o).
Você começa a esconder informações dos seus amigos e da sua família para que não tenha que explicá-las ou inventar desculpas.
Você sabe que algo está muito errado, mas nunca consegue expressar exatamente o que, nem para si mesma.